BR.RJ.COC.OC.COR.PES.3.2
São Paulo, 1 de Novembro de [18]99
Minha querida Miloca,
Após uma semana e tanto de angústias, trabalhando até meia noite, receando a cada instante pela minha saúde e vida, que te pertence e a nossos filhos, vendo cair vitimados pela peste os companheiros de trabalho e esperando a cada instante minha vez, eis-me felizmente livre dessas preocupações, são e salvo, a espera do momento feliz em que estarei junto de ti no seio de nossa querida família.
Daqui a dois dias mais ou menos aí chegando e de viva voz poderei referir-te os transes aflitivos por que passei, tendo-me inoculado acidentalmente me livrei graças ao soro, que vou aí preparado afim de preservar e curar nossos patrícios, caso a terrível moléstia aí chegue. Não te posso descrever as torturas e horror em que preparamos a malas para deixar o Hospital de isolamento. Comecei a sentir assuntos que caracterizam o inicio da moléstia, não podes imaginar as tristes ideias que povoaram meu espirito doente e só nesses transes pude avaliar quão grande é o amor que te tenho e a nossos filhos. Deixemos, porém, de coisas lúgubres que, felizmente já estão passadas e que penso nunca mais experimentar; estou vacinado contra a moléstia e posso encara-la face a face desassombradamente. Passemos a tratar de coisas mais alegres!
Fui tratado com a máxima distinção pelo Governo de São Paulo que proporcionou-me todo o bem estar possível.
Fui acompanhado até a estação de Santos por todas as autoridades sanitárias. O Lutz levou-me até Santos, voltando depois. Em Santos fui recebido pelo Chefe do serviço sanitário que pôs à minha disposição a casa dele e a de um outro colega, tendo eu pedido para morar no Hospital, foi acudido esse pedido. Para que eu pudesse “arejar” de vez em quando, o Governo de São Paulo deu ordem que uma lancha estivesse sempre de fogos acessos à minha disposição. Infelizmente, porém, em virtude do afluxo de trabalho só consegui dar três passeios de ‘ hora cada um.
Estou agora instalado no Hotel mais ‘chic’ de São Paulo. Hoje encontrei-me com o Ministro do Interior que vem pedir me para examinar um local para a fundação de um instituto soroterápico e dar a minha opinião a respeito, por isso não sei ao certo quando partirei.
Adeus minha querida Miloquinha beijo-te muito e muito e peço que faças o mesmo aos nossos filhinhos. Muitas saudades a nossas mães e a todo família e aceita o melhor dos beijos.
Do teu
Oswaldo